Por Fabio Silvestre Cardoso*, especial para a Microexato
Se tomarmos essa afirmação como ponto de partida, não espanta o fato de que, por aqui, a onda de vandalização dos monumentos tenha começado muito antes do que se tem visto mundo afora. A depredação mais substantiva aqui é simbólica: referências históricas, culturais e imateriais são demolidas sem qualquer cerimônia. Cancelamos tudo, sem perguntarmos se, verdadeiramente, deveríamos agir assim.
Ocorre que, em meio à pandemia de coronavírus, não só os estabelecimentos comerciais foram fechados. Como se sabe, as programações das emissoras de TV, aberta e a cabo, também foram descontinuadas. Resultado: uma onda de reprises. Séries, filmes, telenovelas e até mesmo jogos de futebol colocaram em xeque essa nossa difícil relação com o passado glorioso.
Glorioso? Sim, glorioso. Na TV, ao menos por alguns instantes, quando olhamos para o passado, era como se vislumbrássemos que o Brasil já foi feliz. E já foi grande. Não só pela sua economia, mas pelos seus feitos, exatamente em segmentos onde não havia qualquer sombra de dúvida – e que hoje sobram questionamentos –, a produção cultural e o esporte de alto rendimento.
Pelé, seguido de Tostão na Copa de 70, em foto de Tony Balis
Assim, se, nas telenovelas, já existiu um Brasil que se encontrava todas as noites, no futebol havia consenso em torno da relevância do futebol brasileiro no mundo. Aliás, é de se perguntar: qual outro país tem tantos jogos com conquistas da sua seleção nacional para exibir? Lembro-me de ter visto os ingleses eufóricos em 2018 porque chegaram em quarto lugar na Copa do Mundo pela primeira vez em 28 anos; no mesmo período e no mesmo torneio, o Brasil chegou a três finais, venceu duas e, quando eliminado, foi derrotado pelos finalistas – exceção feita a 2018, quando perdeu para a Bélgica, que ficou em terceiro lugar.
O que isso significa? Simples: valorizamos a derrota, porque há um fracasso que nos enche de brio e de virtude, enquanto as vitórias são contestadas ou, ainda, minoradas pelas brumas do esquecimento. E é aqui que chegamos à Seleção da década de 1970.
Aquela Seleção Brasileira – de Pelé, Tostão, Jairzinho e Rivelino – sagrou-se campeã com um futebol que afetou para sempre a imaginação daqueles que adoram esse esporte. Foi o nosso melhor momento e, talvez por isso, foi o início de nossa derrocada.
Dali em diante, houve tentativas, a mais amarga delas em 1982, de reviver aquele momento mágico. Só que, num misto de tragédia e farsa, o Brasil foi derrotado pela mesma Itália em Barcelona, na Copa do Mundo da Espanha. O país jamais se recuperou desse trauma e, por isso mesmo, não foi capaz de se reconciliar com suas conquistas.
Ganhar passou a ser um estorvo inferior apenas à derrota, que era sempre um vexame. A comparação é com 1982, o ano que deveria ter marcado a vitória redentora: tetra com a volta da democracia. Não foi o que houve. O gosto de sangue jamais saiu da boca e a lembrança que muitos ainda carregam daquele choro mostra que a paz e a tranquilidade são ativos de alto valor agregado num mundo onde a dor e o ódio são commodities.
Com a Seleção de 1970, aprendemos que a excelência e o desejo pela vitória podem nos contagiar. Em meio a tanto desalento e desesperança, vale a pena ver de novo – para se emocionar e para guardar no chalé da memória alguns dos momentos dos quais podemos nos orgulhar.
*Fabio Silvestre Cardoso é jornalista, doutor em Integração da América Latina pela USP e mestre em Comunicação pela Universidade Anhembi Morumbi, onde também é professor. É autor do livro Capanema, lançado pela Editora Record. Linkedin
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